Arquitetura Espontânea em Buriti dos Lopes.

Publicado por Erasmo Marcio Falcão em 15 janeiro 2016

Casa-obra de Di Carvalhi.

     Buriti dos Lopes tem um clássico exemplo de Arquitetura Espontânea, a Casa-obra de Di Carvalhi. Em entrevista ele afirma que construiu sua casa sozinho e tudo o que nela tem foi feito e construído por ele mesmo, desde os tijolos onde os confeccionou em uma extinta olaria no bairro Outro Lado da Passagem, as madeiras do teto, portas e janelas que foi cortar no Maranhão, até os adornos diversos de acabamento. Com exceção das telhas, pois as recebeu de uma parenta em permuta. A casa de Di Carvalhi é uma obra viva, infinita para ele, praticamente todos os dias está trabalhando ou confeccionando algo na casa, um painel artístico na parede, uma poltrona, uma mesa, um fogão a brasa, um jarro de planta, sua imaginação é uma fonte emanante de ideias que circundam espontaneamente por diversas áreas como arquitetura, escultura, design, paisagismo, urbanismo e ergonomia.

Artista Di Carvalhi

     Sobre Arquitetura Espontânea, o crítico de arte Oscar D’Ambrosio nos fala que a arquitetura chamada “espontânea” oferece soluções geralmente surpreendentes, fora dos padrões tradicionais e com materiais pouco convencionais. Ele também diz que a utilização de materiais diversos de uso quase indefinido tipo materiais de refugo de construções, cacos ou infinitos adornos é característico desse tipo de produção. Esta descrição aplica-se com integridade aos trabalhos artísticos que compõem a Casa-obra de Di Carvalhi. Não utiliza regras de composição fixas, seus traços são pulsantes.

     O artista nos mostrou os materiais que utiliza na produção de suas obras, são sobras de cimento, correntes de comando de motocicletas, fios de metais, carcaças de ventiladores, objetos de plástico, madeira de refugo, pedras de diversos formatos e tamanhos, vimos até uma tampa de vaso sanitário utilizado como molde.

      Outra característica de seu trabalho é a reciclagem de materiais reutilizáveis. O desenho da planta da casa é único, produzida por um “não-arquiteto” subtende um projeto de paisagismo e urbanismo, pois, a casa tinha ao lado um riacho não perene, ele projetou um desenho paisagístico completo de otimização e utilização do potencial do espaço com a construção de uma pequena praça intitulada “Recanto do Livro”, um cais, ornamentação física e mudas de plantas ornamentais, …

Comunitários visitando a ponte projetada por Di Carvalhi.

     Como não o bastante, detectou um problema, o riacho corta a rua, quando no inverno, nos dias de chuva forte o curso d’água tomava a rua e ninguém podia passar, de modo que ele também projetou e construiu uma ponte por sobre o riacho oferecendo assim, através de uma ação urbanística, a livre passagem das pessoas de um lado ao outro da rua proporcionando à população uma obra comunitária.

     Di Carvalhi é mestre no uso de técnicas ergonômicas, Ergonomia é composta por um conjunto de conceitos que estudam a organização do trabalho no qual existe relação do homem com objetos ou máquinas, aplicada à arquitetura e o design exerce técnicas de adaptação do homem ao seu meio físico, seu trabalho e formas eficientes e seguras do seu desempenho visando a otimização do bem estar.

Poltrona na coluna.

        Novamente, de forma espontânea, Di Carvalhi pratica em suas criações e obras quando lhe falta um lugar para sentar com os amigos, ele desenha uma poltrona na parede e a faz com sobras e, “Voilà!”, Eis uma poltrona de cimento colada na parede, mas, de traço livre, simples e confortável para uma bela conversa como a que tivemos.

Pia e balcão projetados e ornamentados pelo artista.

     Di Carvalhi também é um ótimo projetista de móveis, um verdadeiro designer, “design” é a palavra em inglês para desenho. É a idealização, criação, desenvolvimento, configuração, concepção, elaboração e especificação de artefatos. Essa é uma atividade estratégica, técnica e criativa, normalmente orientada por uma intenção ou objetivo, ou para a solução de um problema e, é isso que nosso artista buritiense faz de forma totalmente espontânea, quando cria seus próprios móveis e utensílios de casa tipo, cadeiras, poltronas, mesas, pias, acentos e até um grande forno de assar bolos.

     Podemos observar também esta habilidade no design de suas esculturas onde encontramos de animais a instrumentos musicais. Belíssimas esculturas longe das formas gregas, mas, próximo da infinitude da imaginação. As esculturas apresentam traços expressionistas com grande emotividade e um assentado primitivismo, porém, seu estilo é maduro e bem definido. São manifestações puras de arte, faz-se uma clara relação com o expressionismo alemão de Ernst Barlach (1870-1930) que também trabalhou escultura em talha na madeira.

Arquitetura Espontânea em Buriti dos Lopes

     É também um forte muralista e criador de painéis artísticos para paredes e muros, geralmente em grandes dimensões na maioria das vezes com temas religiosos. Essa produção é geralmente associada à produção de artistas outsiders, aproximando-se mais da arte e da fantasia.

     Natural do Maranhão, nasceu na comunidade chamada São Paulo, município de Araioses. Seu nome de batismo é Raimundo Nonato Carvalho Silva, mas conhecido dos amigos pelo apelido Mundinho. Relata que dos oito aos dez anos fazia trabalhos com modelagem de massa de argila nas olarias acompanhando o pai no trabalho. Aprendeu a modelar argila com uma antiga “louceira” da região apenas vendo a velha artesã trabalhar, por meio da observando e imitação. Seus primeiros trabalhos eram tigelas, bacias, copos, jarros e um tipo de recipiente conhecido como “alguidá”, geralmente utensílios domésticos, ainda não havia um estilo artístico. Do mesmo modo, através de seu pai, aprendeu a fazer telhas, tijolos e adobes, mais tarde a assar as peças. Lembra-se que ainda aos oito anos construiu uma réplica em miniatura de um lampião Petromax a querosene com tampinhas de garrafas e chamou atenção dos tios recebendo belos elogios.

Painel em moldura de cimento com tema religioso.

     Veio com a família para Buriti dos Lopes em 1976 aos 14 anos de idade no intuito de estudar, contudo, não deixou de modelar e com o tempo passou afazer também talhas em madeira. Aprendeu a trabalhar em várias profissões e em olarias na nova cidade, tornou se também um artesão, já em 2003 precisando trabalhar para manter seus proventos, fazia trabalhos artísticos apenas por hobby, dificilmente vendia seus trabalhos, preferia presentear amigos importantes. Certa vez foi descoberto por um turista holandês através de um amigo em comum, o turista lhe comprou algumas peças e assim nosso artesão buritiense tem obras até no exterior, Holanda mais precisamente.

     Começou a construir sua casa-obra em 1987 passando a morar dentro dela dois anos depois, em 1989. A partir daí, então, imaginou fazer o reboco todo decorado e para isso tomou mão de todo e qualquer material utilizável possível, sobretudo, reciclado e reutilizável. Surgiram molduras, talhas em madeira, placas, painéis, esculturas e com isso entendeu-se como um verdadeiro artesão, dedicando tempo e esforço para isso. Considera-se um “artista de parede” especializado em molduras com massa de cimento e a utilizar o pseudônimo Di Carvalhi.

     Di Carvalhi testemunha que procura ter sua própria identidade artística. Seu traço e sua forma, enfatiza mais o rabisco de traços livres do que a geometria de formas fixas, criando suas cores e texturas. Utiliza suas paredes como maneira de divulgação de seu trabalho e confessa o desejo de deixar sua casa-obra como patrimônio cultural histórico da cidade. Comenta sobre as dificuldades de ser um artista em Buriti dos Lopes por falta de apoio em divulgação da arte e na disponibilização de materiais de trabalho, por isso prefere os reutilizáveis.

     Di Carvalhi também é músico, toca teclado e violão, é compositor, poeta e esportista, corredor maratonista, ganhou algumas competições. Resume assim: Sempre trabalhei sozinho, não me dou por realizado porque tenho muita coisa pra fazer, mas, um pouco realizado por poder escrever minha história em vida por ser identificado por outros artistas da cidade. Observo nas pessoas que sou uma referência na minha cidade, não sou o melhor, mas, sou uma referência.

Galeria de Fotos:

 

11 Replies para “Arquitetura Espontânea em Buriti dos Lopes.”

  1. Avatar Antonio Carlos disse:

    Muito boa matéria Erasmo, valorizar a nossa cultura e nossos artistas buritienses e nosso amigo Mundinho (Di Carvalhi) é isso ai e muito mais…

  2. Avatar Hermnn Diniz disse:

    Casa da Flor de Buriti dos Lopes/PI, em referente a Casa da Flor de São Pedro da Aldeia/RJ, ambas estão carregadas do estilo de GAUDI.
    Parabéns ao artista buritiense Di Carvalhi. Sempre fico apreciando esta obra de arte toda vez que vou fazer uma cópia de chave no vizinho.

  3. Avatar Mário Sérgio disse:

    muito boa, parabéns……..

  4. Muito boa a matéria, meu caro amigo Erasmo. Não se esqueça de que o Rsite1 ficará sobremodo honrado com sua colaboração… Valeu, brother!

  5. Avatar antonio disse:

    parabéns é uma pena que são poucos buritienses que apreciam a cultura principalmente as das artes plasticas,cultura linda mais pouca explorada deveria dá um espaço maior a essas pessoas

  6. Avatar antonio disse:

    na verdade falta o apoio da iniciativa pública .gosto muito das artes plásticas sempre que tiveres pessas raras e antigas como quadros, esculturas,e outras coloca ai pra gente da uma olhada blz

  7. Avatar Ana juliete sousa silva disse:

    História de papai
    Foi como oleiro que na arte se encontrou.
    Ah manusear perfeitamente a argila seus primeiros trabalhos revelou.
    Trabalhando com a natureza, troncos e pedras ganharam seu valor. O tronco agora é canoa a pedra réplica dos gols que já marcou.
    E quem disse que tudo se comprar ,quando se sabe reciclar !
    Ele transformar lixo em peça e faz aos olhos do homem sua obra admira.
    Sua arte é completa até mesmo no pensar e sua história da esquina da vida me desculpe pai mas eu vou falar :
    Nas esquinas da vida a um grupo de amigos em festa, com bebida, fogos, já em outra esquina tem alguém chorando pedindo socorro. Porque lá tem um velório, nas esquinas da vida tem um alguém tranquilo, dormindo sossegado, já em outra esquina tem alguém aflito em grande conflito e tão preocupado, já em outra esquina tem um alguém algo fazendo ou algo criando, tem alguém construindo. Já na outra esquina tem alguém que nada faz, nada cria , nada constrói. Tem um alguém destruindo ; tudo isso acontece. Por que a alegria ea tristeza faz parte de cada esquina de cada vida.
    Quem bem entendeu,em uma dessas esquinas pode estar;
    E para esse homem o irrealizável hoje vem realizar. …

  8. Avatar Carlos disse:

    Chamam isso de arte! uma criancinha de 5 ano de idade faz melhor com massa de modelar.

  9. Avatar Mario Rodrigues disse:

    Se aleijadinho visse essas esculturas horríveis com certeza sairia do tumulo.Comparado as obras dele só as do Elvencio.

  10. Avatar Éder Fagner disse:

    Parabéns pela matéria,realmente ele é muito talentoso!e aos críticos muito obrigado sem vcs não teríamos forças para continua!.

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