A ineficácia da lei sobre drogas no campo da prevenção.
Publicado por Gildazio em 01 julho 2017Segundo o Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito com a Lei (CNACL) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que contém informações dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa no Brasil, desde março de 2014 último até o fina de 2016, dobrou o número de adolescentes cumprindo medida socioeducativa em nosso país e o tráfico de drogas é o crime mais frequente entre os jovens.
Quem trabalha na área da segurança pública, sobretudo na ostensividade do trabalho de rua, sabe que esses números são uma realidade.
Já em 2014, o Instituto Igarapé divulgava uma análise dos números do Sistema Integrado de Informação Penitenciária (Infopen), do Ministério da Justiça, em que 64% das mulheres presas estavam nessa situação pela prática de crimes de drogas – como o tráfico ou o estoque de substâncias ilícitas.
A associação entre o consumo de álcool e de outras drogas com comportamentos criminosos tem sido descrita por célebres criminologistas ao longo da história. E na prática, é fácil perceber essa simbiose. Um sargento da PMPI, em sala de aula em um curso da corporação onde estou instrutora há mais de 15 anos, relatou que, em seus serviços, praticamente 100% dos menores apreendidos são usuários abusivos ou dependentes químicos, e que, na maioria das vezes, os roubos, furtos ou até homicídios por eles praticados têm ligação direta ou indireta com o tráfico de drogas.
Muitos desses meninos e meninas ingressam na criminalidade porque tornaram-se dependentes químicos e precisam de recursos para saciar essa sede incessante da substancia; e a esmagadora maioria deles nem sequer tem consciência do submundo em que vive, porque desde cedo foi a única realidade que conheceu: para eles, é o normal!!
Em visita a uma escola estadual da zona sul de Teresina/PI, a diretora me relatou um fato que tem se tornado cada vez mais corriqueiro em tempos hodiernos. Ela disse que estava sendo ameaçada pela mãe de um estudante, cujo histórico escolar é digno de pena: várias transferências, notas baixíssimas, registros de ocorrências de agressões e outras tantas coisas que deixam qualquer educador, no mínimo, preocupado.
Segundo a gestora, a mãe ficou chateada porque o filho fora retirado da sala de aula porque estava fazendo uso (isso mesmo!!) de maconha na presença de todos. Não bastasse isso, agrediu verbalmente a professora que, segundo o relato, tremeu diante da situação, já que conhecia a história de vida daquele garoto de apenas 13 anos (pai preso… mãe traficante… passagem pelo CEM!).
E há inúmeros depoimentos de professores que se deparam com essa triste e preocupante realidade de estudantes usuários de drogas, na maioria ilícitas, que são ameaçados e intimidados, e que já não sabem como agir. Muitos desses educadores procuram-nos na Coordenação Estadual do PROERD pedindo, literalmente, socorro, depositando na Polícia Militar as suas esperanças para o retorno da disciplina e do respeito aos mestres e ao ambiente escolar.
Mas não somos os salvadores da Pátria! Somos, apenas, meros colaboradores desses profissionais dedicados da educação e que, junto com eles, tentamos levar um pouco de informação sobre drogas para os estudantes, alertando-lhes sobre os malefícios dessas substancias, não só no organismo, mas na própria vida de cada um deles! Porque defendemos a PREVENÇÃO PRIMÁRIA.
Se, e somente se, a criança ou adolescente compreender desde cedo que o prazer que a droga lhe traz poderá se tornar o seu maior pesadelo ao torná-lo um dependente químico, e, que há inúmeras outras alternativas de diversão ou até mesmo de fugir dos problemas sociais em que estão submersos, aí então haverá uma grande chance desse menor cidadão dizer NAO a qualquer tipo de droga e ter mais esperanças de dias melhores para ele próprio e para aqueles que lhes importam mais.
Entretanto, o que temos visto é que os grandes investimentos na área das políticas sobre drogas são direcionados ao tratamento de dependentes químicos ou à repressão ao tráfico de entorpecentes. São recordes de prisões e apreensões, toneladas e toneladas de drogas incineradas pela polícia federal, mortes dos dois lados da guerra ao tráfico…. e… os números de usuários só aumentam!!
Talvez então devêssemos rever essas prioridades de aplicação de recursos públicos ou até mesmo as estratégias adotadas nesse “combate”.
Quem sabe não seja o momento assumir que a Lei 11.343/06 (que trata das drogas, no Brasil) não correspondeu aos anseios da sociedade e de reformulá-la. São mais de 10 anos da edição dessa norma jurídica que tinha como objetivo principal reduzir o numero de prisões ao diferenciar as figuras do usuário e do traficante, o que não aconteceu.
A pesquisa do Instituto Igarapé apontou, ainda, que, em 2006, quando a lei sobre drogas entrou em vigor, 15% dos crimes cometidos em nosso país e que resultaram em prisão eram relacionados a drogas; e, no ano de 2014, esse índice disparou para 28%.
Portanto, não é difícil concluirmos que a atual legislação sobre drogas no Brasil não tem cumprido seu mister, tal qual grande parte das leis que regulam a sociedade brasileira. É flagrante e urgente a necessidade de mudança no nosso ordenamento jurídico, e, principalmente, nas políticas públicas em geral, para que possamos elevar o pilar da prevenção à categoria de prioridade máxima, sob pena de, em alguns anos, ser tarde demais!!
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