Falhas sem Conserto
Publicado por Gildazio em 07 outubro 2017Nesta semana, um menino de 13 anos foi encontrado dentro da cela de um detento condenado por estupro e homicídio, na Colonia Agrícola Major Cézar, em Altos/PI.
Na verdade, não bastasse a absurda falha administrativa, a ocorrência fatídica é apenas a ponta do iceberg de descaso dos equipamentos públicos a um ser cuja Constituição Federal assegura proteção integral.
Eis o perfil da família: o pai, egresso desse mesmo sistema prisional, onde cumpriu pena pelo crime de estupro; a mãe, uma mulher cujas frases desconexas fazem-nos crer na total ignorância de regras mínimas de conteúdo protetivo à criança e ao adolescente, sendo ela mesma uma vítima de um sistema falho; e o adolescente vítima, segundo seu depoimento, era, ainda, obrigado a trabalhar dentro dos muros daquela instituição, apanhando lenha, motivo pelo qual se recusou a voltar para casa após sua oitava (pois sim! o menino e seus pais foram “liberados” após o exame de corpo de delito atestar que não houve conjunção carnal – como se outras formas de abuso não configurasse crime!).
Fico atônita e deveras estarrecida com os rumos que este mundo tem tomado. Tentemos reproduzir a cena (que é de horror!): um pai e uma mãe entregam seu filho de 13 anos a um estuprador, deixando-o em uma cela de uma local onde o infrator cumpre pena, em troca de “ajuda” à família. O garoto, obediente, cala-se diante da ordem dada por seus genitores, e sacrifica-se em prol da única família que conhece. Ë dele a incumbência de submeter-se àquela condição de prover o sustento de seus entes, sucumbindo à lascívia doentia de um criminoso.
Será possível a nós imaginar os sentimentos desse menino? Quem de nós seria capaz de sequer supor o grau de sofrimento dessa criatura?! E como estabelecer uma dimensão da responsabilidade de seus algozes, sejam os pais ou o próprio aparelho estatal?! E o pior de tudo: como reparar o dano (ou os danos!) a esse indivíduo que jamais experimentou o amparo legal que, em tese, garante-lhe proteção integral?!
E o que vamos fazer, doravante?!
Colocá-lo em um abrigo e acompanhá-lo com assistentes sociais e psicólogos…. até ajuda! Mas esse interesse todo, como já vimos em outras tragédias, só perdura até que a imprensa encontre outra matéria que aguce o interesse da população; e, aí, diante do que já é notícia velha, os órgãos também desviam os olhos e já nem se lembram do que um dia fora um escândalo. Restará, apenas, um pobre ser humano cheio de sequelas, algumas irrecuperáveis!
Eu, pelo menos, quero registrar aqui a minha indignação diante de todas a falhas do estado, a começar pela base familiar desassistida, perpassando pelas falhas de controle do sistema penitenciário, até aquelas que perpetuaram a agressão (os agentes encontram o garoto no sábado, e só na segunda-feira tomaram as providencias; e, ainda, o delegado permitiu o retorno do adolescente ao convívio familiar, mesmo após constatar a conivência dos dois em deixar o filho na cela!).
E espero, sinceramente, que este sentimento de repulsa não seja um privilegio meu, mas de todos os brasileiros. Algumas falhas não têm conserto!